mtv 20 anos: indie para “as massas”

21out10

a mtv brasil completou 20 anos de existência ontem. teve festa, ex-vjs se reunindo e muita falação (principalmente no twitter). na minha timeline, por exemplo, a maioria dos comentários a respeito da data reclamava que os melhores anos da emissora já tinham acontecido e que hoje ela é uma grande porcaria, que bom mesmo era quando os vjs entendiam de música, que o massari isso, que o gastão aquilo… blablabla. puro saudosismo.

é inegável que a mtv dos anos 90 era muito mais interessante que a mtv que temos hoje. tinha criatividade, sabia entender e instigar seu público e criou um novo paradigma na tv brasileira voltada ao universo jovem. mas lembre-se que em 1990 o brasil era um país extremamente subdesenvolvido que vivia pulando de crise em crise (collor, lembra aí) e isto só aconteceu porque a mtv era uma emissora nova. portanto, fugir ao padrão era sua (única) forma de sobreviver.

naquela época o brasil praticamente não existia para o pop internacional. grandes bandas quase nunca vinham fazer shows aqui a não ser que houvessem iniciativa$ tentadora$ como o rock in rio, por exemplo. sem falar que a única chance de ver na tv o clipe de algum artista gringo era no fantástico, aos domingos, e apenas se esses artistas fossem realmente grandes e rentáveis por aqui. hoje até o paul mccartney vem pra cá por que acha viável.

a reclamação é que, nos anos 90, quando a mtv brasil surgiu a cena musical era mais legal, tocava rock de verdade, as bandas alternativas tinham espaço e que hoje só tem bandas coloridas, etc e etc. mas a verdade é que sempre foi assim e sempre será. não acredite nessa ladainha que a mtv era o paraíso da música pop. não era.

se bem me lembro, para cada clipe do nirvana, do pearl jam ou do oasis rolavam dez clipes do mc hammer, das spice girls e das boy bands em geral. e olha que estou falando só de assistir na casa de amigos (só fui ter mtv em casa em meados do anos 2000). e, comparado com hoje em dia, os anos 90 eram a era medieval.

saca só: moro em ribeirão preto, cidade rica do interior paulista, desenvolvida, certa vez – erroneamente – rotulada de “califórnia brasileira”. na minha casa (que fica perto do centro) não pegava e ainda não pega mtv pela antena externa. aqui só se assiste mtv se tiver tv a cabo.

na casa da minha tia, que mora em um bairro bem longe do centro numa região mais alta e com menos prédios do que aqui , o sinal da mtv pega quase melhor que o da globo. nos anos 90 nem mesmo na capital paulista a emissora tinha uma abrangência decente. dependendo da região neguinho tinha que fazer gambiarra com bombril para assistir o canal.

por essas e outras razões acredito que a média de audiência da mtv nunca tenha chegado aos dez pontos. hoje em dia acho que não bate na casa dos três pontos de audiência.

ou seja, a mtv no brasil sempre foi e provavelmente sempre será para um público restrito. é para aquele adolescente idiota que chega da escola e não tem nada para fazer durante a tarde. mas também é para o audiófilo nerd que fica vendo bandas alternativas da suécia às três e meia da manhã.

portanto, é até meio cretino dizer que a emissora foi responsável direta pelo sucesso de artistas como skank, jota quest, raimundoscharlie brown jr ou quaisquer outras bandas que tenham atingido o mainstream durante seus anos de ouro.

o skank ganhava vários vmbs, mas o que os fazia vender discos nos anos 90 era aparecer no faustão. os raimundos bombaram clipe lá, venderam milhares de discos com o carimbo “ao vivo mtv” (eu comprei esse disco, que é duplo! ahaha) mas tinham uma gravadora major por trás deles.

ok, hoje em dia o fresno raramente aparece no faustão e é mainstream (ou é indie?) em grande parte por causa da mtv. tudo bem. mas lembre-se que nos anos 90 para ser mainstream o cara tinha que vender 1 milhão de discos. hoje se o fresno vende 50 mil é muito. eles não aparecem com frequência no faustão porque não é mais necessário. hoje o fresno sobrevive apenas com seu público da mtv, que atualmente gira em torno dos 17 anos de idade pra baixo. a pergunta que fica é: e quando o público do fresno crescer, o que vai acontecer? e isso não vai levar muito tempo, hein…

nos anos 90 as bandas independentes eram o underground do underground. hoje em dia elas estão tocando no swu, num palco só pra elas. o mundo mudou. e as coisas inegavelmente melhoraram. ficar chorando porque o fábio massari não tem mais programa na mtv não faz mais sentido. 

carta do kurt “boladinho” cobain à eMpTV que foi leiloada recentemente:

“querida TV Vazia, entidade de todas as Corporações, DEUSES, nós sobreviveremos sem vocês facilmente. a velha escola está decaindo rapidamente, a dedicação de minha vida agora é não fazer nada a não ser insultar algo/alguém .

Ass: kurt cobain, músico de rock profissional”.

pelo menos para mim, o massari é símbolo de um mundo feito de fitas-cassete. no mundo da internet banda larga esse saudosismo é contraproducente. hoje, para o jovem antenado, é mais importante acesso à internet rápida do que o massari na mtv. hoje você cria o seu próprio lado-b. fábio massari na mtv, hoje, é garfo num mundo de sopa. e não estou dizendo que ele é inútil. não é isso, veja bem.

o que estou dizendo é que esse pensamento de que “precisamos de um salvador messiânico do bom gosto” é um pensamento totalmente ultrapassado. a informação agora é horizontal, não existe mais essa pirâmide onde as regras são passadas de cima para baixo, entende?

é visível que a juventude hoje é mais idiota que a dos anos 90, mas a diferença não é tão grande assim. e acredito piamente que isso abre espaço para uma nova onda de bandas que tem o que dizer. repare: todas as grandes reviravoltas musicais surgiram depois de momentos de pasmaceira. e o “efeito boiada” sempre foi fundamental para isso.

o nirvana só surgiu porque a geração yuppie era quem mandava no pedaço nos eua dos anos 80. e foi essa mesma geração quem encheu os bolsos do kurt cobain anos depois, seja comprando discos ou bovinamente usando as calças jeans milimetricamente rasgadas da levi’s.

veja a posição que o brasil se encontra no momento: prosperidade econômica, alargamento da classe média, olímpiadas, copa do mundo. não me espantaria se nos próximos anos o brasil tenha seus próprios yuppies. quem sabe seu próprio nirva…  bom, a cena independente nacional cresce a passos largos. deixe a imaginação rolar… ahaha.

e esse papinho de que “canto em inglês porque sou indie” ou “fazer sucesso é coisa de vendido” já não cola mais. daqui pra frente, nesse mundo cheio de nichos e com micro-mercados ganhando forças, além de ser boa, sua música vai ter que ser financeiramente viável. e grandes mesmo serão apenas aqueles que conseguirem público fora de seu nicho de mercado. chutando por alto acho que 90% das pessoas que gostam de nirvana não entendem o que o kurt dizia. num exemplo mais atual: 90% das pessoas que irão ao show do paul mccartney no brasil só conhecem “hey jude”.

já dizia o velho cobain: “quando até os idiotas e almofadinhas gostam da sua banda é sinal que você está fazendo a coisa certa”.



4 Responses to “mtv 20 anos: indie para “as massas””

  1. 1 jv

    bons pontos aí, vc tem razão…
    a mtv era diferente mas tb era um produto do que as grandes gravadoras queriam vender. e ela não tinha tanta importância quanto um faustão, e continua não tendo.

    mas tb não dá pra dizer que ela não deu uma força pra impulsionar esses artistas. mesmo que aparecesse no faustão, antes haviam passado pela MTV. o britpop — coisa tão distante do Brasil — foi bastante reproduzido na MTV.

    e tb haviam gravadoras por trás. daí que a MTV é só um espelho da industria, não?

    mas eu não acho a MTV brasileira de hoje tão ruim. ela passou por uns tempos de trevas no meio da década, mas agora encontrou um formato bem mais balanceado. só sinto falta um programa como o lado-b.

    • 2 Cadu

      jv,

      você disse a frase que ficou faltando ao texto: “a mtv é apenas um espelho da indústria”.
      as pessoas compram essa ladainha de que a mtv é quase uma contracultura e não enxergam que ela é apenas mais um braço da indústria musical. sinal que essa tal indústria já foi mais inteligente.
      até pouco tempo atrás, ao invés de usar a internet como um tentáculo a mais, ficava brigando contra quem fazia download de músicas.

      mas as coisas estão mudando. por livre e espontâneo medo da falência.
      😉

  2. A música não precisa ser boa, só financeiramente viável. Vide as Claudias Leites, Brunos e Marrones, NXzeros da vida. A tendência, com a popularização em massa da internet, é abrir pequenos nichos. Putz, quantas bandas boas vc consegue encontrar só navegando pelo LastFM por algum tempo? (só para citar um meio).
    Se o cara gosta(?) de Bruno e Marrone e dá de cara com “Pedro e Jeca” (que é mais “legal” pra ele) e acaba se identificando, Bruno e Marrone fica em segundo plano.
    Mas é inocência achar que a galera vai parar de ter preguiça de procurar a “sua música”, eles ainda (por um bom tempo (pra sempre?)) vão seguir a boiada e precisar de alguém que mostre o que eles devem gostar. Triste, mas verdadeiro.
    Em relação a MTV, ainda lembro da época em que eles tentaram incluir na programação pagode e sertanejo. Tiro no pé da porra.
    Na MTV americana toca muito R&B (o pagode deles) e Rap ( a música sertaneja deles), cada um na sua.
    Excelente texto.

    • 4 Cadu

      John,

      com certeza as pessoas sempre terão essa necessidade de tomar papinha na boca. sempre alguém vai ter que dizer o que elas devem ver, ouvir, vestir, etc. mas nem sempre é por preguiça. como eu disse no texto, nem todo mundo é audiófilo e tem paciência para procurar a última novidade do indie rock melódico do sul da escandinávia. as pessoas “normais” trabalham, estudam, namoram e não tem tempo para isso. preferem acreditar em alguém que elas julgam confiável e seguir o que essa pessoa recomenda. e não há nada de errado com isso.

      o que vai acontecer daqui pra frente é que essas fontes de informação serão mais niveladas, vai ser uma troca de informação horizontal. não existe mais essa hierarquia de que “eu sou jornalista/apresentador de tv/músico e por isso eu sei mais que você”, entende?
      cada dia mais a tv vai ser pautada pela internet. e a mtv já está nesse estágio há algum tempo. se bobear, o site deles bomba mais que a televisão.
      muita gente reclama, mas o fenômeno Marimoon (uma menina que só existe por causa do Fotolog) até que demorou para entrar na mtv.

      em relação à música sertaneja, Claudias Leites e etc, sinceramente, ainda vejo uma certa luta de classes aí. a MTV sempre foi uma emissora muito “classe-média branca filhinho de papai”. nunca teve muito espaço para a “ralé” (a não ser o rap). a claudia leite não toca na mtv, mas em todo VMB ela é convidada para entregar algum prêmio. há uma certa discrepância aí, não?

      com essa horizontalização que eu falei a tendência é mudar.

      a nova ordem mundial agora é o “cada um no seu quadrado, junto e misturado”.

      abraço. 🙂


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